CRITÉRIOS PARA O AFASTAMENTO DE CRIANÇAS APARENTEMENTE DOENTES

 

Sendo a evicção escolar uma preocupação quase diária no desempenho das atividades n’O Castelinho, reveste-se de extrema importância a tentativa de construção de um protocolo de atuação que uniformize a ação da equipa pedagógica face a crianças com sinais e sintomas de aparente doença de evicção escolar obrigatória e/ou doença infecciosa benignas aguda.

De acordo com Nunes, Ferreira e Heleno (2010), as crianças que frequentam infantários apresentam um risco duas a três vezes superior de adquirir infecções, quando comparadas com crianças que permanecem em casa sendo que, os pais dessas crianças ausentam-se da sua atividade profissional, em média, uma a quatro semanas por ano, para cuidarem delas no período de doença.
Para Salgado (2012) as doenças infecciosas agudas benignas mais comuns nas creches, jardins-de-infância e escolas são rinofaringites, bronquiolites, dispneias associadas à asma induzidas por vírus, broncopneumonias, pneumonias, otites médias agudas, gastroenterites agudas, conjuntivites, exantemas virais, febres e/ou tosses e/ou vómitos de etiologia presumivelmente viral, a amigdalite estreptocócica, a varicela e o impétigo.
Tendo em conta esta panóplia de doenças e seus sinais e sintomas e considerando que a equipa pedagógica não tem conhecimentos para fazer diagnósticos clínicos é justo inferir que uma das principais preocupações quando em presença de uma criança doente é, não só o seu conforto mas também a prevenção do contágio de outras crianças.
De facto e de acordo com Salgado (2011), são várias as variáveis que condicionam a transmissão das doenças infeto-contagiosas:
o   Características dos agentes infeciosos, incluindo as respetivas resistências no ambiente (fomites);
o   Tamanho do inoculo;
o   Suscetibilidade dos hospedeiros;
o   Características das instituições com agrupamentos humanos:
        Idade e número das crianças
        Número de funcionários por criança
        Distribuição e contiguidade dos espaços
        Formação da equipa que trabalha na instituição
        Regras de higiene
        Condutas de exclusão de crianças doentes
No entanto, para o mesmo autor (embora em outra publicação datada de 2012), embora a generalidade das doenças infeciosas agudas sejam contagiosas, são também benignas e autolimitadas, pelo que a evicção das crianças portadoras destas doenças só se justificará se essa exclusão diminuir os casos secundários, o que não acontece na prática pelas seguintes razões:
o   A maioria dos contágios dos agentes infeciosos destas doenças:
o   Iniciam-se um a três dias antes do início dos sintomas;
o   Prolongam-se por vários dias a várias semanas após a resolução das manifestações clínicas;
o   Podem ter origem em indivíduos pouco sintomáticos ou em portadores-sãos (indivíduos colonizados sem sintomas);
o   As fomites – as superfícies ou objetos inanimados, porosos ou não porosos, contaminados com agentes infeciosos – são uma das principais formas de contágio dos agentes infeciosos nas CJIE e nas IDL.
Para Salgado (2012), em países com regras bem definidas de exclusão e inclusão destas crianças, por cada evicção adequadamente proposta, outras seis são desnecessárias. Na ausência de critérios bem definidos de evicção, a exclusão desnecessária será substancialmente maior.
De acordo com Nunes, Ferreira e Heleno (2010), a nível institucional, poderá ser útil o desenvolvimento de protocolos de atuação face a sintomas comuns pois, pelo menos do ponto de vista conceptual, esta medida poderia levar a uma uniformização da atuação nos diversos estabelecimentos e, eventualmente, reduzir a exclusão não justificada.
A variabilidade de conduta perante um caso de doença aguda é, para Grilo, Abreu e Moleiro (2016), uma realidade com que encarregados de educação e profissionais de educação e de saúde se deparam diariamente, sendo motivo de desacordo entre os vários profissionais, bem como de confusão para os pais.
De acordo com Salgado e Salgado (2012), em situações bem definidas, é a própria lei vigente em qualquer país, que obriga à evicção por virtude de doença infeto-contagiosa. Em Portugal, a evicção escolar obrigatória é regulamentada pelo Decreto Regulamentar nº 3/95 de 27 de Janeiro que dista 22 anos da presente data necessitando, na opinião dos vários autores consultados, uma revisão face aos avanços tecnológicos, médicos e epidemiológicos que se verificaram nesse período de tempo.
Ainda para Salgado e Salgado (2012), à semelhança do verificado noutros países, a discussão da evolução dos conhecimentos científicos sobre modificações das condições epidemiológicas, das melhorias diagnósticas e terapêuticas das doenças infecto-contagiosas, tem motivado sucessivas atualizações da lei vigente, o que não se tem verificado em Portugal.
De acordo com os mesmos autores, não obstante a falta de uma estratégia nacional sobre a evicção de crianças dos estabelecimentos públicos de educação, proliferam em Portugal as instituições públicas e privadas para crianças cujos Regulamentos Internos incluem as recomendações sobre a evicção escolar, não tendo em conta o regulamentado na legislação e, muitas vezes, contrariando o mesmo.
Não pretendendo O Castelinho contrariar a legislação em vigor mas reconhecendo a complexidade da temática e procurando uma solução uniforme e de aplicação seriada, propõe-se a aplicação de um protocolo de afastamento temporário das crianças aparentemente doentes, baseado não em diagnósticos clínicos (reservando-se esses para os profissionais de saúde) mas sim no estado geral da criança e em determinados sinais e sintomas passíveis de serem detetados pelos profissionais de educação. Este protocolo baseia-se na bibliografia consultada e está de acordo com consensos de peritos da Fédération Fribourgeoise des Crèches et Garderies (Suíça), da American Academy of Pediatrics (Estados Unidos da América), da American Public Health Association (Estados Unidos da América) e do National Health and Medical Research Council, Australian Government (Austrália).
 
Proposta de critérios para o afastamento de crianças aparentemente doentes
 
A – Sinais e sintomas que, pela interpretação dos profissionais de educação, impeçam a participação da criança nas atividades de grupo:
·         Os profissionais de educação deverão especificar o grau de severidade das manifestações dos sinais e sintomas em 3 graus:
o    Grau 1: a criança apesar de estar aparentemente doente, manifesta interesse pelas atividades e tem envolvimento total nas mesmas, e não apresenta sintomas sistémicos de doença (exemplos exantema macular não febril, varicela não febril);
o   Grau 2: a criança reduz a sua atividade habitual normal, pela presença de sintomas sistémicos – por exemplo por ter febre – mas volta a interessar-se pelas atividades do grupo algum tempo após a administração do antipirético;
o   Grau 3: a criança manifesta pouca vivacidade e atividade, com sinais e/ou sintomas que impedem o seu envolvimento nas atividades do grupo.
·         Se os pais e os profissionais de educação das instituições discordarem nas razões para a exclusão e estas assentarem nas capacidades da criança para participar ou na disponibilidade dos profissionais de educação em assegurar as atividades educativas às restantes crianças, estes são soberanos na sua decisão, não podendo os pais exigir aos mesmos a responsabilidade de aceitar a criança e de lhes assegurar os cuidados e a vigilância, durante o período em que a criança cumpre os critérios de afastamento temporário. Se a razão para a exclusão se dever a uma potencial doença infeto-contagiosa que ponha em risco as outras crianças do grupo, e existirem diferentes opiniões por profissionais de saúde, caberá à Autoridade de Saúde a decisão final.
B – Doenças e/ou sinais e sintomas que exigem mais cuidados dedicados à criança doente do que os profissionais de educação da instituição podem proporcionar, com risco de comprometer a saúde e a segurança das restantes crianças;
C – Presença dos seguintes sinais e/ou sintomas cuja intensidade ou potencial gravidade exija cuidados médicos e/ou vigilância apertada:
·         Mau julgamento clínico – criança que tem aspeto doente, “ar de doença”;
·         Febre associada a:
        Idade inferior a 4 meses;
        Alteração do comportamento e/ou do estado de consciência;
        Prostração;
        Vómitos repetidos / incoercíveis;
        Exantema / erupção de início muito recente;
        Petéquias, equimoses;
        Convulsão.
·         Sintomas ou sinais de doença potencialmente grave e/ou perturbadora do bem-estar:
        Prostração;
        Letargia (excessivamente sonolento e pouco reativo);
        Gemido, choro ou irritabilidade mantidos ou intermitentes;
        Dores mantidas, intermitentes e/ou intensas, em qualquer local;
        Convulsão;
        Sonolência progressiva ou excessiva;
        Rigidez da nuca;
        Exantema associado a febre e/ou a alteração do comportamento e/ou do estado de consciência – exceto se um profissional de saúde determinar que a situação clínica não exige a exclusão;
        Sinais de dificuldade respiratória: polipneia, adejo nasal, gemido expiratório, tiragem;
        Incapacidade em falar;
        Tosse perturbadora para a criança.
        Sangue nas fezes (retorragia) ou melenas;
        Vómitos repetidos (2 ou mais nas 24 horas prévias) ou com sangue;
        Diarreia profusa (muitas dejeções por dia ou dejeções muito volumosas) v;
        Sede intensa e/ou outros sinais de desidratação;
        Icterícia;
        Melenas e/ou retorragias
        Aftas orais / inflamação na boca com sialorreia intensa.
 
Em jeito de conclusão resta acrescentar que, mais importante do que o afastamento temporário das crianças doentes é a adoção de medidas de prevenção da transmissão de doenças tais como a correta e atempada higienização das mãos, higienização e desinfeção dos espaços e brinquedos/utensílios e o ensino às crianças (na medida da sua compreensão) aquilo que elas podem fazer para se proteger.